quarta-feira, 10 de outubro de 2007

EXT. CARRO. MANHÃ

ANINHA
É, tipo, pode ser que eu pense assim porque, nunca, ninguém muito próximo meu morreu, mas podia
ser que eu tivesse a mesma visão também né?

MEL
É impossível você imaginar que termina ali, naquela terra e num cimento


CULA
É a visão que ela tem, né Mel? Pelo amor de deus...
Muito confortante, inclusive, Aninha!

ANINHA
Ai, Cula, desculpa
Eu nem devia falar essas
coisas, eu sei que tu detesta,
mas, assim, é que é impossível.

CULA
Ai, aninha, eu entendo. Mas
é que eu realmente não gosto,
sei lá velho. Num me
faz bem?


EXT. CARRO. MANHÃ.

ANINHA
Entende não, tu não entende
ninguém, muito menos
você próprio, e menos ainda seu pai.

MEL
Quarenta, herculano, quarenta

CULA (20) freia de vez.

CULA
Porra, será que pegou?

MEL
Menino, pára não. Tem gente atrás


EXT. ESTRADA. MANHÃ

POLICIAL
Habilitação e documento do carro, por favor

Cula entrega os documentos ao policial.

POLICIAL
Do seu pai, o carro?

CULA
Era

POLICIAL
Num é mais não é, rapazinho?

MEL
Algum problema, moço?

POLICIAL
Não, não, nenhum!
Imagine se eu ia arrumar
problema pra uma sinhôrita
bonita assim!

Tão ino pra onde?

CULA
Vai ficá aqui im Maraguji, mermo.

POLICIAL
Ta certo


EXT. PRAIA. MANHÃ

Mulher se deita na areia. HOMEM VELHO (40) aparece e desaparece. Ela suspira, se levanta e caminha em direção ao mar.


INT. CASA. NOITE

Cula caminha pela casa. Senta na escada com um espelho e faz a barba com uma pinça.


INT. QUARTO. NOITE

Com barba, Cula entra. MEL (20) está sentada na cama, chorando baixo. Cula entra, senta-se ao seu lado e acende um cigarro.

CULA
O cinzeiro ta aí, Mel?


EXT. PRAIA. MANHÃ

Mel corre na praia.


INT. QUARTO. NOITE.

Mel enxuga uma lágrima enquanto procura o cinzeiro na cama. Entrega o cinzeiro pra Cula. Ele bate a cinza, se levanta e sai.

MEL (sussuro)
Idiota

Mel encosta-se na parede e acende um cigarro. Joga as cinzas no chão. Cula entra, sem barba, e se senta ao lado dela. Mel suspira e encara-o.


EXT. PRAIA. AMANHECEDO.

MULHER (20) tira da bolsa alguns papéis. Mulher queima os papéis e suspira.


INT. VARANDA. AMANHECENDO.

CULA
Eu já expliquei que não tem nada a ver com isso.

MEL
Mas, Culinha, vai IMPLICAR em algo parecido.

Cula, olhe pra mim pelo menos!


EXT. PRAIA. AMANHECENDO

Mulher corre pela praia com maquiagem borrada. Vai desacelerando o passo até cansar e cair no chão. Ela chora.

MEL (V.O.)
Mas IMPLICA em algo parecido
IMPLICA em algo parecido
IMPLICA em al...

MEL (V.O)
Cula, olhe pra mim pelo menos!


INT. VARANDA. AMANHECENDO.

Cula olha para Mel.

MEL
Meu único problema, Culinha, é
saber que sempre que eu for
falar, você vai fugir pela tangente.
Eu não agüento guardar...

Mel começa a chorar.

MEL
É tão difícil, é tão ruim


CULA
Num é não, Mel. Cresça.
Deixe de ser criança, lide com isso.

Cula se levanta.

CULA
Ta que pariu ...
Eu não agüento,
entende?
Eu re-al-mente não agüento

Cula acende um cigarro

MEL
Eu não to
pedindo isso.

CULA
Pois a gente
vai fazer
um acordo agora,
certo?

MEL
Não


EXT. PRAIA. MANHÃ

Mulher se deita na areia. HOMEM VELHO (40) aparece e desaparece. Ela suspira, se levanta e caminha em direção ao mar.

MEL (V.O.)
Não


EXT. PRAIA. MANHÃ

A caminho do mar, a Mulher encontra Mel correndo. Elas se olham. Mulher observa Mel de dentro do mar.

MEL (V.O.)
Não


INT. COZINHA. MANHÃ

Cula abre a geladeira. Olha para sala e vê Mel saindo.

CULA
EEEEEEEEEEEEEEEEIIII


INT. SALA. MANHÃ

Mel pára.


INT. COZINHA. MANHÃ

CULA
Vai onde?


INT. SALA. MANHÃ

MEL (irônica)
Fechar um contrato com o mar.


EXT. PRAIA. MANHÃ

Mel corre, molhando os pés na água. Vê uma Mulher lhe observando. Desacelera o passo e se senta. Mel deita na areia.

MEL (sussuro)
Fechar um contrato com o mar.

Fechar um contrato com o mar.

Fechar um contrato com o mar.

MEL
FECAR UM CONTRATO COM A PORRA DO MAR, CARALHO!!

Homem velho aparece e desaparece, em pé ao seu lado. Mulher está em pé, ao seu lado.

MULHER
Também tem papel pra queimar?

Mel se assusta e se senta. Mulher se senta junto dela.


INT. COZINHA. MANHÃ

Cula põe o avental e separa panelas.


EXT. PRAIA. MANHÃ

MEL
Nomear sentimentos?

MULHER
Exatamente. Quando extrapola o
que é objetivo, a palavra perde
o significado pra se esvair no
entendimento pessoal de cada um.


INT. COZINHA. MANHÃ

Cula tira panelas do fogo e prepara uma bandeja de café-da-manhã.

ANINHA
Jáááá??

CULA
Bom dia, Aninha!

ANINHA
Cadê tua irmã?

CULA (irônico)
Foi assinar um contrato aí, cum mar


EXT. PRAIA. MANHÃ

MULHER
O ar é grávido de possibilidades,
de cheiros, de presenças.

MEL
Só que eu não sei pertencer de
verdade a tudo isso. É como se
eu tivesse de fora, só observando.
E eu não entendo, não assimilo. Na
minha cabeça não se passa essa...
essa gestação, sei lá

MULHER
Claro! Não se supõe que alguém
teja preparado para nada. Mas a
dor vai fugir do seu corpo, vai
ficar leve, mel, mais leve que o ar.

MEL
E qual o peso da caneta?


EXT. PRAIA. MANHÃ

Cula segura uma bandeja na praia e vê Mel falando sozinha.

Nenhum comentário: